quarta-feira, 27 de junho de 2012







Pandeireiro

O som agudo do pandeiro anunciava... 
O ritmo, era o coco
acompanhando o violão
De sete cordas de aço

Ao fundo a voz suave
Do trovador solitário
Parecia cantar distante
Num horizonte sem rios ou lagos
Mares ou correntes de ventos

Era tempestade poente
Sibilar de serpente.
regendo o som da terra
Tentando se comunicar
Fazendo-se Xavante.

"Tum tum" Fazia o pandeiro
No derradeiro do norte
Como quem anunciasse
Um precipício diante de seus olhos

"Trum trum" declarava o liame
Na curva da morte
Divisa da razão, loucura ou sorte
Em uma paixão quase sempre repleta

"Trum tum pá" tocava o pandeiro
Ecoando mistérios
Dialogando com o poeta
Soando mais que música
Era o som da elegia, essencia de poesia aparente
Que nascia sem se dar conta

Só quem sente, pode entender
O pandeiro é poema pronto
Enquanto trovador, o poeta deslumbrado
Que hipnotizado, vaga regido pela ópera de samba.

ALLIMA

terça-feira, 19 de junho de 2012



Tempo que ama

Na varanda do velho casebre do séc. XlX
A anciã sentada na cadeira de balanço
Tecia uma coberta rendada, cheia de flores
Assobiava, cantarolando Chiquinha Gonzaga
Enamorando o infinito à sua frente.

Como quem bastasse quieta
Flertando o passado 
Com saudosismo
Aguardando ser encontrada.
No falecido esposo

Lembrava dos campos
Do marido, dos cafezais 
Da mesa cheia, seus filhos rindo
Esperando a Galinha Cabidela

Ecoando felicidade pela pequena fazenda
Depois se despedindo, para morarem nas capitais.
A deixando só

E prosseguia a velha imaginando 
Vendo seu próprio filme se passando
Na tela do seu quintal armado
Com arrebol pintado
De cores laranjais 

Observava a lua, surgindo vagarosamente.
Então levantou, e ascendeu o lampião a querosene
Voltando imediatamente à sua lida
Como quem tecia marcas, saudades
Tentando achar motivação 
Permanecer viva

Ouvia o canto da Juruva
E o pouso do Beija-Flor tesoura
Enquanto corria por suas pernas um Tatu Bola.

Já era madrugada
O vento chegava forte
Trazendo sossego.
Era a voz do seu marido
Chamando:

- Zefa, vem fia, vem.

Ela sorriu meigamente
Lembrara de Roberto, seu amor.
Afrouxou lentamente as mãos
Deixou a coberta cair
Firmou os olhos, e viu uma nuvem de estrelas
Brilhando sem parar
Uma gigantesca revoada de Vaga-lumes
Fechou os olhos, e entregou-se aos braços da morte.
Como quem buscava carinho
Encontrando amor 
E com ele...
Partindo.

ALLIMA




Sendo Estações

Saí pra ser Outono
De folhas verdes
Outras secando, em amarelo ouro
Ao calor do sol morno

Em parques, luzindo
Coloridas flores
Sendo morada de ninhos, em galhos secos
Revoadas de pássaros se despedindo
Andorinhas, Beija-Flores, Rolinhas

De majestosas manhas frias
Dias curtos, com chuvas intensas
De neblinas espaçadas em serranias
Com estradas marcadas por folhagem
Por passos mais lentos.

Como quem buscasse inverno
Fogueiras, colchas, filmes, romances
Amores...
Num nevoeiro quase sempre estampado
Como quadro pintado
Ou cartão postal
Identificando uma passagem
Dessas, que transformam vidas
E indicam direção.


ALLIMA








O viajante

Era um caminhar solitário
Desses de estradas infinitas
Como as do sul da Bahia

Subindo e descendo
Numa reta só
Com coeficiente angular
Desses que pode-se ver o horizonte
A quilômetros de distância

Sensação de inércia
Vontade de correr feito vento
Pra poder chegar
Beijar o mar 
Banhar
Sentir o lugar

Depois voltar
Caminhando...
Tudo, metro a metro
sem parar
Buscando a direção oposta

Fazendo destino
Seu legado
Sem desistir ou refutar.

Só quem viaja pode compreender
A sensação de ver o mar
De conhecer horizontes
Dos sóis escaldantes
Das feridas nos pés.

Dormir ao relento
O cheiro da caatinga
Água do mandacaru
A onomatopeia da viagem
O som da criação de Deus

Os vilarejos as pessoas
As paixões...
Sem pedir carona
Apenas indo com brisa...
Ora pro norte
Ora pro sul
Sendo rosa de vento

Chuva tempestiva
isolamento.

Vendo o mundo de forma diferente
Andando...Vivendo...
Sonhando...Chegando...
Sempre partindo.
Num viajar de dar inveja.

ALLIMA

segunda-feira, 18 de junho de 2012







Renascer


O tempo era árido 
Desertificava campo vivo
Transformando-o em sertão
Desse de cangaceiro conhecido

Buscando a caça entrelaçada 
Pelos galhos cheios de espinhos
Das caatingas procurando água
Tentando achar vida
Na ferida da terra.

Como flor de mandacaru
Se curvando ressequida
Derramando sua seiva
Como se sangrasse
Padecendo

Mas bastasse um orvalho
Uma única gota de sereno
Para os ribeiros, açudes e vales
Surgirem como se caíssem do céu.

Destacando o verde por todo o horizonte
Dos mais belos montes
De fendas repletas de
Ninhos com carcarás
Flores de orquídeas
O camaleão, a lebre, o bode, o jumento

Firmando a vereda
Se fazendo primavera
Em qualquer estação
Sempre se vestindo de Tieta.

Essa é o sertão
Vida apaixonada que brota
Sem pedir licença

Numa resistência
Inacreditável



ALLima




Desejo ser


Quero ser Dois 
Talvez Três, Quatro, talvez Cinco
Numeral que nunca seja "Um"
Que nunca esteja só.

Quero ser metade
Ramos de flor
Estojo repleto de lápis

Rabiscar traços casados
Que se cruzam
Conexão
Quero ser paixão


Dessa de fogo
Que arde e absorve
Queimando tudo
Até virar pó.

Seja eu a sorte
Ou encontre a morte
Sendo apenas "Um".

Porque "Um", é o que basta para estar morto
Para estar vivo é preciso mais que UM
Dois, Talvez Três, Quatro, talvez Cinco.


ALLima

domingo, 17 de junho de 2012





Iluminar feito velas


Quero ser a luz 
Que ilumina a lamparina velha
Fazendo desenhos imaginários 
Com sombras de dedos

Como se possuíssem tintas
E fossem pintando a parede vazia
Usando aquarela inusitada
De cor negra.

Eram pato, coelho, cavalo
E no fim se fazia sono
Num dormir ao relento

Dentro de celeiro
Sentindo o cheiro
Do café da manhã
Feito no fogão à lenha

Quero ser a luz do céu
Quem sabe o sol?
Talvez deseje apenas aquecer
Teus sonhos em noites frias
Em dias nublados.
De primaveras vãs.

Quero apenas iluminar
Ainda que seja uma vela.
Quero é acender-te

Te aquecendo o ser.
Sendo fagulha ou centelha
Amando-te

Mesmo em forma de sombras
Projetadas em paredes velhas.


ALLima

sexta-feira, 15 de junho de 2012













Me perde em tempo
Sem chance de dizer adeus

Me perde em tempo
Sem chance de dizer adeus.
Como quem rasga fotografia velha.
Tentando se desvencilhar

Apagando tudo
Exterminando vestígios de saudades
Como se fosse possível

Tás incendiando tempestade 
Segurando uma centelha
dizendo que odeia
Despejando sua ira
Vomitando Deus.

E pensas que sairá ilesa
Sem obter feridas
Dessas que deixam marcas?

Ledo engano querida
No amor, essas cicatrizes
São quase que constantes.
Marcas da vida.

Não há saídas
Nem despedidas certas

ALLima
Cacos de vidro

A morte me tomou
Fazendo-me pó
Por completo

Aquecendo-me em forno 
Alimentado de carvalho seco
No tacho de cobre fervente

Me descobrindo vidro
Dando sentido ao copo
em forma de corpo
Deixando-me só, em cima da mesa

Descuidado, derrubando
Fazendo pedaços
Espalhando cacos
Como quem não sente dó.

E vi você juntado
Com lágrimas escorrendo
Para me fazer mosaico
Dando nome, verbo ou tento

Matando saudade
Bebendo o licor derramado
Com mãos sujas de sangue
No ato de desespero

Me retendo por inteiro
Parte a parte
me tomando todo.
Se despedindo em prantos

ALLima

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Quem é você?


Sou uma porção do mundo indivisível
Metade átomo, metade mistério


Seria bom se pudessem ir 
Além dos meus passos
Sonhar muito além das estrelas. 


Queria ser poesia, quem sabe? 
Um dia quero ser formiga,
Beija-flor, Canário da terra,
Tanto faz


Tudo o que quero é ser vento
E soprar sem direção
Poesias de amor. 
Quero ser canção.


ALLima

A saudade bateu, e agora?

Aquele perfume suave, o olhar fixo, o sorriso frouxo
E eu com a cara toda amassada pela manhã.
Por uma noite mal dormida.

Eu via você vestida de preto 
Elegantemente, com salto agulha 
Postura de Vênus.
Havia vestígios no quarto do nosso amor.
Sobre mesa, o copo de Martini e suas digitais marcadas 

Pelo batom vermelho ainda úmido.
A vitrola velha ainda se ouvia uma canção de Alceu.

A saudade bateu, e agora?

Como poderei dormir tranquilamente 

Sabendo que poderá não mais voltar?
A janela poderá estar fechada,

E a lua escondida entre nuvens negras.
Que aquilo tudo seria apenas mais um dos meus delírios.
Invenção dos meus fantasmas.

Ficava assim
Esperando que você chegasse 

Numa manhã de outono junto ao sol.
Pisando o tapete de desejos estendido pela casa.
Tocando o pescoço com seus lábios mornos
Tuas mãos me procurando vagarosamente

Entre cobertas entrelaçadas.
Imaginando.

Se tudo for apenas um retrato
E  por um acaso, sentir vontade de me procurar
Saiba que a saudade bateu, e dói estar só.
Vendo a moldura sem imagem 

Da minha solidão vestida de mulher.

ALLima
Ter


Abrace 
Por fora
Me encobrindo 
Por completo

Deixando-me à mostra
Ensinando o que é tento
Acariciando minha alma

Abrace-me sedento
Que o tempo agora
Pede calma

E assim vamos nascendo
Dia a dia
Sem pressa ou medo

Dando ritmo ao compasso
Pela Vida afora

Nos preenchendo
Passo a passo

Nos amando
Dentro e fora

ALLima
Idealizar


Jeito de mulher fechada
Com cara emburrada
Bebendo chá quente
De maça, com mel e canela


Debruçava sobre o livro de contos
Infringentes .
Parava por um instante
Suspirava, como quem se imaginasse
em cena.

Cortando fios, trincando dentes
Tecendo desafios
Conspirando contra sua mente
Se fazendo revirada.

Perdendo sentido
Fremindo sonhos à base de unhadas
Como se agarrasse Deus.
Para lhe contar o que pensava

E dizia vagarosamente a si mesma:
-Eu sei que posso
E quero.
Ser o cais que ancora tuas
Caravelas.

Pra te fazer seguro.
Içando tuas velas.
Te navegando sempre

ALLima






Dentro ou fora? 

Era imensa 
Trazia consigo, grandes ramos de saudades.
Me buscava no íntimo, a cada dia
Balbuciando versos de poesia 

E meia dúzia de sacanagens.

Me sentia forte, completo

Numa sensação quase delirante.

Em noites frias, teu canto ecoava 

Na mais perfeita bossa nova 
Dançávamos agarradinhos 

Como se fôssemos uno, indivisível.

Não sabíamos se estávamos dentro ou fora
Naquele instante, eramos a personificação.
O sentido da palavra, o verbo, o som.

Na mais completa virtude dos amantes.
Somente eu e tu, enrolados em lençóis
Na mais íntima das paixões.
Apenas éramos.
Eternamente sós!

ALLima
Calmaria


Não me atrevo a sonhar
A visão dos teus olhos


Porque me pego 
A delirar fantasias
averbando desejos
Sem te consultar.


Não vou fremir delírios insensatos
Vou pairar sossego
E te reinventar.

Fechando os olhos
Imaginar indo, ao teu encontro
Reencontrar n
o teu avesso.
Te desvirar
Inquerindo-lhe.
O lado certo

ALLima
Verbalizando


Cuide bem do que tem
Poderá vagar perdido
Procurando outro alguém
Que simplesmente
Não prende tuas correntes 
Na abita.


Semeie amor em blocos 
Em canteiros firmes
De terra preta batida
Para ficar bem plantado.


Quando for colher
Não se esqueça de cheirar
Tem aspecto doce 

Cores de âmbar.

Possuindo lindas flores
Que tornam a brotar
Sempre germinando

Tentando eternizar

Isso ensina a conjugar.
Porque AMAR, pode até ser verbo.
Mas querida...
Eterno, sempre deve ser conjugado
No infinitivo pessoal
Na primeira pessoa do plural.

"Para eternizarmos Nós"



ALLima