quarta-feira, 25 de julho de 2012


Palavras mudas

Já não sei onde terminam minhas linhas
Nem em que verbo me sustento
Nessa audácia de criar versos
Calo, silenciando o tempo
Desacelerando o eixo do mundo
E escuto meu eco latente

Paro, num instante, palpitando em mim
Sentimentos ócios
que divagam plenos
Que me devoram como vermes
Consumindo meu cadáver morno
Com cheiro fresco
Um gosto doce

Esse viço de poesia vã
Onde está?
Reviro minhas gavetas repletas de traças
Pelo interior oco
Não acho substantivo algum

Pelas palavras que já não me vestem
Deixo o poema perfeito
A vaga memória de um poeta
Que sugado na sua angústia
Deita e chora comovido
como quem houvesse perdido o dom de deus

Allima

terça-feira, 24 de julho de 2012















A verdadeira poesia

Ela voava sem asas
Sim, ela voava
E parecia vento
Uma tormenta
No meio do mar

Pavor das caravelas e veleiros
Não perdoava navios negreiros
Que tentavam escravizar
impiedosa, naufragava-os sem dó

Corria campos longínquos
Desertos perdidos
As majestosas manhas
Tocando o infinito
Pelo poente despertar da noite

Ela voava sem asas
Sim, ela voava
Vinha em forma de sereno
De choros gotejando
Chovendo intensa
Procurando seu lugar
Na face da terra

E beijava o solo
Como quem buscasse desejosa
O companheiro no meio do norte
Vestido de astro
Pelo azul de Netuno 

Ela voava, agora com asas
Sim, ela voava
Pela crista da montanha
Observando a rapina caçar
E ficava hipnotizada
Pela magia da vida
Na sua cadeia alimentar 

De repente, tudo escureceu
O universo em sua volta abriu-se
Feito uma janela
E tudo começou a piscar 
Por todos os cantos
Eram constelações inteiras
numa plenitude só

Ela fechou os olhos
sorriu docemente
Como se tivesse encontrado o que buscava
Levantou-se, despiu-se de suas asas
Vestiu-se de luz
Brilhando imaculada


Não era mais um anjo
Estava ali a poesia viva
Que vaga sem planos
Tentando ser achada
E qualquer lugar
Na forma de amor.

Allima.

quarta-feira, 18 de julho de 2012





Emudecidos

Prestamos atenção no silêncio
Porque nos fala tanto
Desses diálogos infinitos
Pelo foco dos olhares que se perdem
Transcrevendo laços
A fim de eternizá-los

E de repente as lágrimas
Rolam intensamente
Substituindo versos
Dizendo coisas singelas, cheias de mistérios
Amores alados que voam livres
Enfatizando o instante

Pelos toques tênues
A pele arrepiava, toda desejosa
Sem dizer uma única palavra
Rasgando os véus cortinados
Que vestiam as janelas entreabertas
Como se trajassem nossas almas

E sorrateiramente
A nudez dos corpos
Enamoravam-se distantes
E plena, te fez em mim
Tomando-me

E eu, atrevido
Fiz-me em ti
Ardendo-te
No ópio

Numa completude única
Sem deixar inerte perdida
Uma única palavra muda
Pois, poderia ser mal compreendida
Se ganhasse voz

Allima

terça-feira, 17 de julho de 2012



Queria ser


Essa poesia toda que penso
A sinestesia, a metáfora, os clichês 
O desequilíbrio sensorial
Desses amores infundados
Na coisa viral poética

Que decifra sentimento
Pela infinita razão prostrada
Sem muitos critérios
Marginalizando versos

E saracotear linha à linha
Pela essência do avesso
Implodindo todo o meu universo
Que jaz inquieto no peito
Querendo dizer algo
Pelas madrugadas  frias

Não, não há como ser poeta
Vou criar um novo nome
Sou "ESCREVO"
Escravo que escreve
suas dores sem pedir licença
Sem essa coisa patética

Quero me reinventar gente
Materializar-me em poesia
Pra nascer no poente
Sem precisar dizer nada

Allima


domingo, 8 de julho de 2012


Máquina de Seduzir

Me fintou num instante
Com olhos intrigantes
Num convite sedutor
A mergulhar-te fundo
Pela porção Afrodite
Que se despia lentamente

Tinha íris cor de mel
O corpo de contornos delineados
Pelas curvaturas ousadas
Um passear a caminhar-te
Pelo dorso, cada pedaço de pele

Passo a passo entorpecido
Explorando tuas arestas
Nas fendas mais distantes
Entregando-me inteiro
As tuas cálidas mãos
Que inquiriam o íntimo
Usando-me

Desnudo a tua frente
Namorando clandestinamente
Sendo tragado num único gole
Pela tua janela de Vênus
Que tomava tudo
Feito conhaque

Causando palpitações
De puro êxtase
Na tua boca levemente úmida
Entreaberta, Escorria veneno mortal
De víbora serpente
Enfeitiçando o lugar
Como se Pedisse:

"Atreva-se"

Nem parecia mulher
Era anjo ou demônio
Surrupiando almas
Possuindo tudo
Fazendo gozar
Sem ao menos perceber
O quanto é imensa
Essa coisa mágica
Vestida de mulher

Allima 

quarta-feira, 4 de julho de 2012





Rumba da Mágoa

A chuva fina caía sobre o velho cigano 
sentado à beira da fogueira
Contemplando a janela de sua alma
Que se abriu sem pedir licença
Deixando a mágoa passar

Ela não vestia branco
Ou pano de seda
Estava nua, completamente
Estendia-lhe as mãos
convidando-o à dança

Emocionado, o velho levantou-se
E tocou a face, acariciando-a
Envolveu-lhe nos braços
A tomando por inteira

Segurando um velho punhal
O cigano Seduzido
Batia pés e mãos
Olhando atentamente as curvas
Da poesia dançante

Rodopiavam a fogueira
Pegando brasas
Em movimentos suaves
como se quisessem brindar
oferecendo calor

A áurea gelada

Os ventos que sobravam
Soavam concertos de cordas
O Estalar da madeira queimando
Parecia pandeiro e castanhola
Enquanto sua companheira
Dançava rumba

Parecendo flutuar

Era o tempo da dança
De leveza e graça
no mais lindo baile dos pés

Exaustos, sentaram sobre a campina
A mágoa, oferecendo-lhe colo
E deitado, o velho sucumbiu aos toques
Sendo imediatamente arrebatado 



A alma bateu a janela subitamente
Levando-o Sob a proteção de sentinelas

Para o acampamento eterno
Onde a mágoa não faz morada
Sendo sua nova casa

A tenda do amor.

Allima